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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A CAPIVARA INSISTENTE

Insistentes. Não vejo outra palavra que qualifique melhor o que observo nos torneios de xadrez, com relação aos seus jogadores, senão esta: insistentes, insistentes e insistentes. Está claro que nem todos vão vencer a maior parte dos jogos, nem todos vão jogar partidas brilhantes que possam se orgulhar e - muito menos - nem todos irão angariar alguma espécie de premiação em dinheiro ou status de campeão. Mesmo assim, eles estão lá: pagam a inscrição, viajam de longe, gastam horas e horas dos seus finais de semana e, acreditem, não desistem tão fácil daquilo. Insistentes, insistentes, insistentes. Que outra palavra poderia definir àqueles que se mantêm firmes num ideal que, convenhamos, tem poucas chances de dar certo ou ser diferente do resultado habitual? O xadrez nos faz iludidos de que podemos vencer qualquer partida, já que não há “melhor elenco”, "erro grosseiro de arbitragem" ou “condições adversas por estar na casa do adversário”, etc. O que ele sente, eu sinto. O que ele enfrenta, eu enfrento. São as mesmas peças para cada lado e, perder ou ganhar, vai depender unicamente de mim. Ou melhor: vai depender de cometer menos erros do que ele, o oponente. Essa impressão, esse sentimento de persistência, habita grande parte dos enxadristas. Vejam só: se perdêssemos tudo, sempre, provavelmente não teríamos tanta vontade de jogar. Ninguém que seja lúcido, apanhando sem parar, vai continuar optando por uma briga. Se só ganhássemos, por outro lado, chegaria um momento em que a vontade diminuiria. Tudo, fácil demais, perde o tesão. Então viajamos, pagamos e competimos, crendo, firmemente, que vamos vencer. Que o adversário logo vai pendurar uma peça ou não perceberá a engenhosa combinação engendrada em nossa mente. Os mais sádicos até pensarão: ele irá sucumbir ante o bonito sacrifício de Dama que surgirá daqui a alguns lances, deitando seu Rei em sinal de rendição. A mesma sensação de sorte que acomete um comprador de bilhete de loteria assola o enxadrista mediano, sem expectativas ou grande força, que se inscreve em um torneio de xadrez. Ele pensa que pode vencer. É claro que, racionalmente, sabe que não ganhará o torneio, não assim tão fácil, porque ele “não tem tempo de se dedicar tanto quanto os outros”. Mas ele acredita, sim, lá no fundo do seu âmago ele tem convicção disso: posso ganhar qualquer partida. Os pequenos e inexplicáveis momentos pelos quais passamos quando ganhamos, ou mesmo a penitência que nos castiga quando a derrota vem da forma mais inesperada, já que vencer dependia exclusivamente de "um detalhe mínimo que deixamos passar", é o que nos faz continuar jogando. Por isso, lá vamos nós, de novo, de novo e de novo, insistir naquele mesmo ritual: sentar, ajustar as peças nos quadrados, checar o relógio, preencher a planilha, cumprimentar o adversário e mover: 1 e4 ou 1 d4, não importa, a pretensão nunca muda. Somos insistentes demais na paixão que nos move.

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